AÇÕES AEILIJ - Trevo de Leituras
JANEIRO / 2007
Giselda Laporta Nicolelis lê O enigma de Iracema, de Rosana Rios...
... que lê Além do portão da vila, de Eliana Martins...
... que lê Como é duro ser diferente, de Giselda Laporta Nocolelis.
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O enigma de Iracema
de Rosana Rios
Resenha de Giselda Laporta Nicolelis
il. Lelis e Alexandre Camanho
Escala Educacional, 2006
136 pp.
Ubirajara, o Bira, chega à cidade de Fortaleza, em companhia do pai, Paulo, da namorada deste, Diva, e de sua filha, Ci. A mãe de Bira, falecida precocemente, foi quem lhe deu esse nome, título de uma das obras do escritor cearense, José de Alencar, de quem era admiradora.
Na praia do Meireles, há uma estátua de Iracema, homenagem ao mais famoso livro de Alencar que conta a história da bela índia que se apaixona por Martim, homem branco, e morre ao dar à luz o filho, Moacir. Ao chegar à praia, Bira, espantado, dá com uma jovem morta aos pés da estátua - o orifício na cabeça e a ausência de qualquer arma de fogo junto ao cadáver sugerem um assassinato. Bira tem um insight: a morta também se chama Iracema. Alertado pelo filho, o pai aciona a polícia.
A partir daí, a autora tece uma trama intrincada cujo objetivo é descobrir: quem matou Iracema? Bira une-se a Nando, filho dos donos da hospedaria onde está a família, para descobrir o (a) assassino(a) da pobre moça. No melhor estilo de histórias de mistério, as pistas vão surgindo aos poucos, açulando a curiosidade do leitor - há de tudo: poemas de cordel escritos por um conhecido poeta cego e que contam histórias arrepiantes; um sujeito mal encarado que segue a família de Bira; um policial de sorriso matreiro e que talvez esconda o que realmente sabe; um escultor famoso que vive em Paris e virá inaugurar outra estátua de Iracema - sem falar em outra Iracema, assassinada há dois anos, e cujo assassino jamais foi encontrado... De descoberta em descoberta, os fios da meada vão sendo puxados enquanto o leitor sacia a curiosidade até chegar ao final inesperado. Ponto também para as belas ilustrações, que parecem pinturas.
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Além do portão da vila
de Eliana Martins
Resenha de Rosana Rios
il. Lúcia Brandão
Edições SM, 2006
176 pp.
A partir de um artigo pescado no jornal e de um passeio a certa vila histórica de São Paulo, Eliana Martins criou uma história saborosa, que tem seus momentos alegres e tristes, temperada com uma pitada de fantasia e muita realidade, levando o leitor a uma viagem no tempo: a história de Cora Viana, que no começo do século XX teria morado com a família, de origem italiana, na Vila Operária Maria Zélia.
Enquanto vemos Cora crescer, conhecemos a vida das crianças operárias daquela época, que começavam a trabalhar na fábrica de juta aos oito anos e que, no verão, faziam piqueniques à beira do rio Tietê. Vemos passar os anos através dos olhos dela, tornando-se mulher na dureza do trabalho rude da fábrica; depois, experimentando o desemprego, a luta dos operários para sobreviver, as reviravoltas na política...
Num mundo conturbado, Cora desabrocha timidamente, desejando ver a vida que transcorre além do portão da vila, mas é sufocada pelas dificuldades e os conflitos com o pai autoritário.
A garra da personagem, temperada pela suavidade da narrativa intimista em primeira pessoa, é realçada pelo projeto gráfico do livro. O texto impresso em cinza azulado e as ilustrações em tons róseos evocam uma São Paulo antiga cheia de vilas, casarões e donzelas recatadas...
Além do portão da vila é, mais que a história de uma criança em terras paulistas, um mergulho mágico no tempo; e o tempo preservou as casas da Vila Maria Zélia assim como as lembranças dos que ali foram crianças, que ficaram com as mãos grosseiras por torcer a juta na fábrica, que viram sua cidade crescer e prosperar, mas ainda tiveram o gostinho de tomar banho nas águas límpidas do Tietê.
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Como é duro ser diferente
de Giselda Laporta Nocolelis
Resenha de Eliana Martins
il. Andréa Vilela
Quinteto Editorial, 2005
112 pp.
Layla, a protagonista da história, acha que tudo nela é errado: desde o cabelo até a falta de vaidade. Sua mãe, Viviane, é bonita, magra e de cabelos lisos. Profissional bem sucedida, não se entrosa bem com a filha. Seu pai, Rogério, foi o garoto mais cobiçado da escola, quando jovem. Hoje, o piloto de avião continua chamando a atenção das pessoas por sua beleza. É pelo pai que Layla se sente amada. Ele, para ela, é perfeito. "Por que sou assim desengonçada?" é a pergunta que vive nos pensamentos de Layla.
Nessa busca de explicação e localização de si mesma, na sociedade em que vive, Layla cruza com outras pessoas diferentes: gordas; magras; feias; tão bonitas que afastam os garotos; baixas; negras; péssimos alunos; e outros excluídos por serem brilhantes. Entre essas pessoas, ela encontra o amor. Apaixona-se por QIspanto - apelido que Pedro ganhou por ser alto, magro,desleixado e de cabelo arrepiado. Um apelido baseado apenas em seus defeitos, deixando de lado o fato de ele ser um aluno brilhante.
"Como vou conquistar o Pedro, se ele nem sabe que eu existo?", é outra pergunta que Layla se faz. Na caminhada em busca de resposta para suas perguntas, vai descobrir em si mesma virtudes que nunca pensou ter. Enquanto tenta conquistar Pedro, descobre que a mãe não é tão ausente, nem o pai tão perfeito. Que todos somos diferentes.
A maior parte da história é escrita no presente. Isso faz com que o leitor fique mais próximo dos personagens, sentindo-se, por vezes, parte da história. As ilustrações, em branco e preto sombreado, dão ao livro um aspecto suave, quebrando a tristeza de alguns trechos. Como é duro ser diferente remete-nos ao mais profundo de nossas vidas, mostrando, de maneira clara, a possibilidade de modificações.